DIA ZERO
Tal como foi referido nos Telejornais de todos os canais televisivos, os sites de meteorologia tiveram durantea semana passada um volume de consultas anormalmente alto, levantando suspeitas sobre um conhecido grupo de pirataria informática. Felizmente o sistema de encriptação da milícia é de última geração e apagou o rasto que levaria ao nosso centro de operações, pois os camaradas milicianos, com as malas feitas há vários dias, não conseguiram controlar os níveis de ansiedade e faziam sucessivas consultas informáticas na esperança de verem on-line um qualquer fenómeno atmosférico que não colocasse em risco mais um plano de acção preparado com elevado rigor.
Mas nem mesmo o alerta da Protecção Civil abalou a coragem dos nossos bravos e ninguém faltou à chamada com desculpas de mau pagador. Presume-se que tenham tido mais receio das retaliações internas que das intempéries propriamente ditas.
Mas nem sempre houve consenso. Enquanto uma facção propunha medidas drásticas que implicavam uma intimação directa ao S. Pedro, com ameaça de, caso se mantivesse o prenúncio de chuva, se anulasse o processo de beatificação, a outra facção, bastante mais moderada e com grande temor à força divina, protestou que era melhor não se entrar em blasfémias. O dilúvio que nos acompanhou nos dias seguintes é prova de quem levou a melhor.
A chegada da coluna à Lousã ocorreu ao final da noite de 6ª feira, com ligeiro atraso face ao previsto. Primeiro, uma má introdução de azimute no GPS da Transit, depois um belo repasto de bacalhau assado com batata a murro, temperado com muito azeite e alho, e finalmente, uma série de semáforos cor de vinho tinto verde foram as condicionantes.
Depois de finalmente acomodados nas camaratas, respeitando-se logicamente a hierarquia das patentes (os oficiais não se misturam com a soldadesca rasa) era hora de descanso, recuperando-se forças para o combate do dia seguinte. Os mais afoitos fizeram ainda um brinde com Beirão e os realmente destemidos fizeram uma incursão à Padaria na esperança de, pelo menos, lavarem a vista. Azar. A melhor “gaija” que lá estava era uma Bruxa do Terreiro das ditas, que resolveu vir à cidade. Tiveram por isso que gramar com o buço e os carrapatos. Bem feito.
DIA UM
O inimigo estava bem preparado e tramou-nos logo na primeira noite, negociando, com o bar (paredes-meias com a pensão) uma noite de karaoke que se prolongou até às 4 da manhã. Desde então só fomos perturbados pelo leve ressonar de alguns camaradas, de tal modo que alguns hóspedes julgaram que era uma moda e foram praticar para o corredor, devidamente munidos de cobertor e almofada A noite foi dura e as expressões faciais ao pequeno-almoço eram marcantes.
1ª ETAPA – manhã
Depois de aprovisionadas as rações de combate, para evitar outro levantamento de rancho como o das célebres sandes de pála-pála, a coluna seguiu bem cedo na primeira incursão ao cimo da serra. Apesar de a meteorologia no campo base se mostrar favorável, assim que entrámos dentro da nuvem os impermeáveis mostraram-se indispensáveis. O frio não nos afectava, por isso fomos directos aos trilhos do Terreiro das Bruxas, pondo à prova a nossa destreza de pilotagem. Quatro descidas sem (muitas) baixas e material (mais ou menos) intacto motivaram-nos na incursão às pistas da Mondraker, onde efectuámos mais três descidas.
INTERVALO – Almoço
E porque nem só de bikes vive um rider, alojámo-nos no albergue habitual, onde foi montada a cozinha de campanha: sandes de mortadela e batata frita. Eis como umas fatias de carnes frias (e não estou a falar dos dedinhos da malta) podem fazer toda a diferença! A conversa era animada, discutiam-se linhas, trajectórias e descreviam-se as descidas feitas como se os outros não estivessem lá estado. A boa disposição era geral e só foi abalada quando alguém referiu o professor Xibanga, persona non grata por aquelas bandas, pelo mau agoiro das suas previsões e nítida falta sensibilidade. Por isso o melhor era seguir para bingo e retomar as descidas. O camarada Daniel deu também o mote para esta incursão da Milita, lançando o grito de guerra “Vaiiiiii Magalhãeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeees!”
2ª ETAPA – tarde
A decisão estava tomada: direccionámos a coluna para Gondramaz, onde fomos recebidos com fortes ventos, chuva e um cerrado nevoeiro. Passado o gate de saída, os camaradas seguiram trilho abaixo.
A chegada ao final do trilho foi marcada por dois eventos dignos de nota: a manobra fenomenal do camarada Roscas ao cruzar o palanque, e a misteriosa ausência das carrinhas. Farto de esperar, o camarada comandante das tropas resolveu mostrar por que motivo é ele o líder, e pôs as peninhas a caminho. Os outros não tiveram outro remédio se não seguir o exemplo. A meio da subida, a tropas mostraram mais à vontade a praticar o duplo sarapitola do que a realizar operações de busca e salvamento. Os dois batedores regressaram passado um bocado, seguido de um par de faróis, o que foi motivo de alívio. Restava saber onde andava o outro par. Interrogados, os responsáveis pelo transporte contaram na primeira pessoa o agoiro vivido pela evocação feita ao Prof. Xibanga e perderam-se logo na primeira curva“É por aqui, não, é por aqui, vamos por ali, volta para lá...” etc etc-Resultado: uma inversão de marcha feita à má fila, e toma lá. Transit atolada. Nem para a frente nem para trás. Restava a Vinalda que lá percorreu 45 trilhos até que, por exclusão de partes, só restava o correcto. Pelo meio , reportaram o avistamento de uns “bambus”, descendentes cruzados de não se sabe que animais, e diz quem estava na guarnição da carrinha que a tensão era já grande (“Estamos lixados. Daqui a nada não há luz, ficamos aqui perdidos e temos de passar a noite no meio da serra. Grande porra, estou com o meu sentido de orientação todo marado”).
Organizou-se rapidamente uma missão de salvamento, para que a guerra pudesse continuar.. A equipa de resgate mobilizou-se e, após troca de condutor, lá tirámos a Transit do atolanço o que nos permitiu retomar as descidas. A última do dia foi a cereja em cima do bolo. A descida completa para Mirando do Corvo, num trilho exigente mas também divertido com paisagens serranas deslumbrantes. No final, e como vem sendo hábito, lá estava o descarado espião inimigo a filmar as manobras. Ainda havemos de aparecer nos jornais, nem que seja pelos piores motivos...
3ª ETAPA – Manutenção
Contrariando todas as recomendações dos fabricantes de bicicletas, socorremo-nos da estação de serviços mais próxima e com as mangueiras de alta pressão tirámos todos os vestígios de lama. Nada mais importava. Agora só havia vontade de tomar um banhinho quente e prepararmo-nos para o jantar.
4ª ETAPA – Jantar e Recolher
Limpos e perfumados lá fomos à janta onde, logo de entrada, virámos uma terrina de sopa e 4 cestões de pão, seguidos de 1 bitoque, 3 bifes de novilho, varias grelhadas mistas, dúzia e méis de cervejas, sobremesas, cafés e, como não podia deixar de ser, BEIRÃO. O repasto foi ainda animado pelo visionamento de filmes didácticos, onde o camarada Daniel mostrou grande à vontade. Ao que consta, tem uma colecção inesgotável. Quem recolheu cedo aos aposentos ferrou logo o galho, mas a incursão nocturna foi mais bem sucedida que a da noite anterior e já deu para ver alguma coisa.
DIA DOIS
Ao pequeno-almoço, as primeiras baixas. Três desistências, umas das quais com fuga e abandono da coluna, acto altamente condenável e cuja punição irá ser decretada em comissão já delegada para o efeito.
1ª ETAPA
Havia alguma indecisão nas hostes, mas mesmo com as referidas baixas lá fomos serra acima, até nos depararmos com uma carrinha de outros milicianos, metida numa valeta de meio metro, com duas rodas no ar. A mobilização foi imediata e quase total. Quase, porque houve quem assobiasse para o lado e seguisse sem prestar auxílio aos companheiros de infortúnio. Felizmente tudo se resolveu com grande rapidez e retomamos as actividades com descida directa para Cacilhas, via Interminável. Com o tempo a não dar mostra de clemência, as tropas iniciaram então a última descida, desta vez via Amazónia, onde os militianos puderam mostrar tudo o que aprenderam durante as manobras de Inverno, desde o grito de guerra Vaiiiiiiiiiii Magalhãeeeeeeeees, até trilhos alternativos “all wet”, shores com direito a banho de rio, front flips e caracóis…... Ao meio-dia estava a guerra terminada, pelo que procedemos à limpeza do arsenal no chafariz de Cacilhas.
2ª ETAPA
Graças às técnicas de guerra psicológica e ameaças de acções NQB, conseguimos persuadir o responsável da caserna a deixar-nos tomar banho e mudar de farda já fora da hora. Posto isto, faltava rechear o bandulho, o que foi feito com grande competência. Durante a refeição, houve tempo para visionar alguns detalhes das manobras do fim de semana, onde foi possível confirmar que o camarada líder Eng. Fininho equipou a sua Trek com um motor, e que toda a tropa aprendeu na ponta da língua o já célebre grito de guerra...
VAIIIIIIIIIIII MAGALHÃEEEEEEEEEEEEEEEEESSSSSSSSSSSSSSSSS
3ª ETAPA
O regresso foi assegurado á moda do SCP, ou seja com tranquilidade. A Transit só chegou aos 100 Km/H porque o camarada Grilo teve de conduzir em substituição do condutor designado que se lesionou á hora do almoço. Já a Vinalda era sempre a fundo, com o camarada Daniel a bater a marca de pintor 40 até ter sido forçado a abandonar o posto por lesão contraída na noite anterior durante a incursão á Padaria.
As saudades são já muitas por isso já está a ser planeada a próxima incursão da Milícia, desta feita ás terras Algarvias. Mas antes, e a não perder, haverá o dia dos Pais Natal.
Abraços a todos.
PS: saudações ás patroas que venham ler a crónica. Os maridos portaram-se todos á altura nada havendo a reportar.
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